WTC, 2001. Foto  James Nachtway – Time 20010911

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Consideremos os dois vectores na imagem. Qual deles define uma prepon-derância no limite? Nenhum, é evidente; mas a vibração de prepon-derância já não é deletível. Esta dualidade é puramente virtual – artificial. É um momento angular dinâmico que propicia a visão de um momento dialéctico puro. A raiz desta função é indeterminada – e no entanto existe uma dualidade exterior absoluta que aperce-bemos escalar à própria gnose. O índice superestrutural de um aconte-cimento deste género é enorme, e não é redutível pela evolução – ou melhor, por um dos bisturis apoptóticos da evolução: a erosão. Compreendemos agora melhor, por exemplo,  como se articula a nossa estrutura de investigação informática, e por que razão não nos diluímos na redução final dos dois bits fundamentais: dominamos esse campo.

FMNL2001

 

Semana da Moda _ Madrid _ Setembro 2011

 

 

O Pesadelo Americano

                                                              Fermanl. 25 de Setembro de 2001

Lembras-te do World Trade Center?  Eram  aqueles  dois  imensos paralelipípedos pousados como peças de um xadrez fantástico em Manhattan - tu dizes que não eram, são... e, de repente, o pesadelo é demasiado real para poder ser suportado.

Nós  temos  que  dizer  aos Estados Unidos da América que o cenário de terrorismo com que fomos confrontados em Setembro de 2001 não se insere, de forma nenhuma, na nossa perspectiva de futuro para a Humanidade. Aprendemos a amar e empenhá-mo-nos numa América que não é apenas o orgulho de uma tecnologia de vanguarda que ultrapassou o capitalismo oco, mas sobretudo um povo que não quer estar só - e, nesse nível, honra os seus semelhantes. O empenhamento decisivo dos USA no desen-volvimento e expansão da Internet resgatou-a  do shylock americano e proporcionou-nos o encontro a um nível superior, mais dinâmico, mais real - mais vivo.  Aprofun-dámos a nossa simbiose cultural e maravilhámo-nos com o quanto de novo e impor-tante sentimos derivar - e evoluímos. É  por isso que a nossa lealdade ética tem de ser superior.

Um dos frutos mais excelentes da União Europeia foi esse novo e entusiasmado olhar sobre as Nações Unidas  -  sobre a Humanidade, afinal.  Nunca  até então tivéramos uma  percepção tão nítida da importância concreta do senado  planetário  -  e evolu-ímos.

A nossa massa diferencial tornou-se dinâmica. A espécie humana amadureceu para o empenhamento numa nova etapa científica onde o espartilho do hermetismo teorético teve de se render ao diálogo novo e pujante deste nosso século XXI. O nosso conceito de Revolução tornou-se mais lúcido,  mais  rapidamente capaz de reconverter as  velhas estruturas de modo a melhor poderem  servir a  consecução  dos nossos melhores objectivos. Conquistámos o reformismo para a Revolução.

Doravante,  o nosso critério de evolução passa  pela reivindicação  absoluta  de uma realidade nivelada com esse nosso empenhamento. Aprofundámos demasiado a nossa gnose estrutural para podermos ceder o estatuto  de realidade histórica aos aconteci-mentos que colidam com o  Mundo Novo  que quotidianamente construímos.  A infor-mação perversa que constituiu o campo mediático de  Setembro de 2001  só pode ser encarada como um sintoma de alienação estrutural que, agora todos nós, recusamos. A  ferida narcisista  não foi,  não é nem nunca há-de ser  uma componente  do  nosso sonho americano.

Os grandes arranha-céus edificados pelo advento da civilização científica e industrial já não podem ser rotulados como  meros símbolos descartáveis de um  período histórico ultrapassado - são estruturas  necessariamente concentradas  dos grandes processadores urbanos que naturalmente ajustamos ao enquadramento mais eficaz para o nosso avanço.

 

Secado o pasmo do primeiro impacto, dei comigo a olhar para esta fotografia de um hall em ruínas do World Trade Center, captada ainda antes do colapso final dos colossais e impassíveis budas de Manhattan; e ao olhar para aquela escadaria, outrora oculta pela decoração luxuosa e exuberante, mas que agora revela o design ingénuo e primitivo de uma singela chave mecânica, não pude conter uma tangência de infinita nostalgia no coração camarada dessa América que nunca traiu a minha parceria de futuro. Mais do que se ele próprio o fizesse, aquela chave de cimento, aço e pó surgiu-me como o grito de um operário que bradasse "Isto é Meu! É do meu esforço e do meu trabalho que surge este edifício maior que os meus sonhos meninos ancestrais; e sejam quais forem os ventos que o varram ele permanecerá, uma ferramenta como esta, para o Mundo Novo da Humanidade Livre!"

Sou apenas um semelhante aos milhões de portugueses geograficamente locais a esta velha Europa de onde cheiro a maresia atlântica e disparo a minha nave à descoberta; mas eu quero ir a New York! Quero subir ao terraço da torre norte do World Trade Center, ao entardecer, quando a sinfonia dos néons se acende em Times Square e a Grande Maçã sorri - e lá do alto atirar um beijo enorme aos filhos das estrelas! Lavarei os meus olhos com o pó da balaustrada ainda virgem da erosão do tempo; e descerei no elevador, de mãos nos bolsos e com um sorriso fechado, até ao rés-do-chão onde morre o pesadelo e Manhattan é a euforia de viver na Terra.

Timespaces

“A ferocidade anti-taliban de Marina não deve ser traduzida como um sentimento pró-americano, como ela faz questão de explicar: "Nós temos muita pena do que aconteceu em Nova Iorque, solidarizamo-nos com eles, com a sua dor, e somos contra qualquer forma de terrorismo. Mas os Estados Unidos têm de tentar descobrir qual é a forma certa de combater o terrorismo, e diferenciar uma nação de quem a domina, destruindo-a de forma criminosa." Recolhi este pequeno trecho de uma notícia do Público de 20010925. Marina é uma revolucionária afegã que luta pela emancipação feminina do seu país oculto pelas burkas que a intolerância religiosa impõe a todas as mulheres – e que tenta promover formas de ultrapassagem à terrível miséria quotidiana do povo. Que por isso é perseguida. Mas sobretudo é um ser humano cujo discurso, polido e racional, não consegue ocultar o terror em que neste momento vivem milhões de outros seres humanos que apenas são povo, como nós, sentindo avizinhar-se o armagedão da vingança americana. As jogadas tácticas e estratégicas dos senhores da guerra que manipulam agilmente o best do terrorismo na arena internacional escapam aos olhos velados de Marina, como escapam aos olhos da imensa maioria desses povos que apenas querem construir o seu dia a dia com uma réstea de sonho ancorada ao voo evolutivo que todos nós, como espécie, prosseguimos. Talvez Marina, mais culta e instruída, conheça o significado da palavra apoptose – um termo que designa o suicídio celular que constantemente renova o nosso organismo, eliminando as estruturas gastas e defeituosas para que todo o nosso corpo se regenere; mas para a esmagadora maioria dos afegãos, como até mesmo para a grande maioria dos povos ocidentais, incluindo os próprios americanos, apoptose é apenas mais um daqueles muitos palavrões do jargão científico que escapam completamente à sua semântica. E, no entanto, a apoptose é um facto com que os seus corpos lidam, inconscientemente, todos os dias; e, no entanto, também esses corpos gigantescos que são os diversos agrupamentos sociais  - os povos e as raças – engendram sábia e friamente mecanismos de apoptose ocultos por detrás das listas necrológicas que se entrelaçam no banal quotidiano.

O problema dos atentados suicidas é que nos privam de qualquer possibilidade de podermos sequer perguntar porquê aos seus autores - o que é que, no limite, os induz a praticarem o seu acto desesperado. O que é que, para além de todos os desvarios de fanatismo possíveis de induzir, é neles suficientemente forte para precipitar a ultrapassagem completa do reflexo imunitário, arrastando consigo seres inocentes que antes deveriam ser objecto da sua convicção, religiosa e política? Que cegueira é essa que os impede de ver o absurdo evidente da sua actuação? Ninguém consegue viciar os dados no jogo com o Absoluto. À medida que a lógica suicida se aproxima da sua solução final, existe uma revelação estrutural que naturalmente desmistifica essa solução – e a vida prevalece; o suicida não quer a solução final – quer uma solução circunstancial para um pesadelo insuportável. Mas, então, o seu acto é um acto falhado à partida porque carece de radicalidade; e a alienação do suicida transforma-se assim numa alienação colectiva porque o seu foco circunstancial se esfuma num fantasma infinitamente inalcançável.

O atentado que destruiu o World Trade Center coincidiu com um período de estudo e investigação intensos em que, com os meus amigos e colegas de trabalho, procurámos abordar e aprofundar o conceito de interface, não só na perspectiva tecno-informática que recentemente mais o vulgarizou, mas sobretudo nas suas implicações como conceito-limite para a compreensão da fronteira pessoal e colectiva onde nos reconhecemos sociais. Sendo o interface o limite onde o nosso universo subjectivo enceta o diálogo, decorre que, em última análise, não conseguiremos nunca saber qual o modo como o nosso interlocutor observa o outro lado – o fora de nós. Isto seria bizantino se o processo – que individualmente se solve numa irrelevância gerida simplesmente pela ética pragmática – se não verificasse igualmente para os diversos grupos sociais, incluindo os povos e as nações. E verifica. Quando nos consideramos como elementos de uma cultura que é a cultura portuguesa, lusíada, considerada em toda a sua diáspora universal, atingimos um limite onde, na realidade, desconhecemos em absoluto qual a imagem que as outras culturas mundiais colhem de nós nesse interface cultural. Nós “cremos” que os outros nos vêem “assim”; e contentamo-nos com a lógica veiculada pelos ecos que entretecem a nossa comunicação. Funciona, e pronto. Mas nada nos garante que estejamos a prosseguir a linha economicamente (em sentido lato) mais vantajosa – e muito menos que, subitamente, a lógica aparente se não transforme num corolário de negação.

O mesmo raciocínio é válido quando nos remetemos ao papel de observadores do concerto mundial. Vemos, por exemplo, o que é a América – os USA – e a sua cultura, e descarregamos no interface as sucessivas ilações-premissas para o diálogo; mas não sabemos o que é essa América, realmente, “por dentro” – se é, de facto, “assim”. Ou, como diriam os americanos, “toda a gente sabe que dentro dos frigoríficos vivem duendes verdes; o problema é que quando abrimos a porta do frigorífico eles desaparecem”. Confrontados com a informação que nos chega dos atentados, remetemo-nos para um periférico “é evidente, mais tarde ou mais cedo era previsível que tal pudesse suceder...” e, petrificados perante a materialização do absurdo impossível, procuramos razões e responsáveis para os actos perpetrados – quando, afinal, a nossa primeira reacção à hipótese de singularidade deveria ser a mais ingenuamente óbvia: aconteceu, de facto? Vimos que foi assim; mas foi realmente “assim”? A estruturação interna dos diversos campos culturais gera naturalmente mecanismos evolutivos que têm forçosamente de ser servidos – e são servidos - por uma mimese esotérica que garante a sua defesa e ocultação. Tecemos previsões geralmente correctas para o comportamento lógico dos USA; mas a criação do bloco europeu veio introduzir um dado absolutamente novo no equilíbrio mundial; e o menino-prodígio americano viu-se de repente colocado perante o facto de ver a ribalta do seu space-cadet mutada num interface onde o público ovante se transformou num conselho senatorial até então desconhecido. É dificilmente imaginável o esforço de adaptação que foi exigido ao campo americano. Diluído o capital científico através da rede mediática mundial, o velho mundo rejuvenesceu numa metamorfose imparável que acabou por impor ao novo mundo uma dura rotação do seu interface de comunicação capaz de responder ao novo equilíbrio de valores. Tudo se modificou, desde o fundo estrutural para o diálogo económico e para o comércio até à própria atitude do cidadão americano perante o mundo e perante a vida – e a pin-up sofisticou-se, tornou-se de repente mais senhora, mais contida – mais europeia. Poderia ser de outro modo? Claro que não; mas o grande motor mundial, que após Yalta se deslocara do Rhur para os cordões industriais que através de Seattle, Detroit e tantas outras cidades da América, fluíam rumo às estrelas, viu-se transformado (até pela própria evolução do programa espacial, transportado da guerra fria para a Estação Espacial Internacional) num motor, já não quase que exclusivamente americano, mas cada vez mais resultante da cooperação entre os diversos líderes tecnológicos da Terra. Durante cinquenta anos, a América liderou o desenvolvimento mundial, arrastando consigo a União Soviética (que, ironicamente, foi a pioneira do espaço, para acabar por se transformar numa seguidora do programa americano até ao ressurgir dos discípulos de Tsioltsin com o programa Soyuz-Mir), o Japão, a China e, mais recentemente, a Índia e os países europeus da AEE. Foi um esforço tremendo, pago pelo brain-drain dos melhores cérebros de todo o mundo congregados em torno da Stars and Stripes – e pelo imperialismo económico, como sabemos. E que teria continuado se os USA não tivessem cometido dois erros fatais no concerto geoestratégico: o Vietnam e o Cambodja. Eis os alicerces onde começam a ruir as torres gémeas do World Trade Center. O sonho das estrelas não era, não podia ser da velha América conservadora e republicana que bocejara na estreia mundial de 2001 – A Space Odissey – era dos jovens, dos hippies que adoraram o filme de Stanley Kubrik e o transformaram numa bandeira para o seu admirável e fantástico Mundo Novo. Que viriam a constituir as fileiras da América democrata e progressista do final do século XX.

A América republicana não é reaccionária por recusar o desenvolvimento, mas por se escorar numa imanência totémica absoluta onde a hipótese de qualquer espécie inteligente que não a humana e terrestre não merece mais crédito do que a Namíbia ou o Afeganistão. Existe grandeza nessa visão patriarcal e bíblica que reivindica o Homem como Senhor da Criação Universal; mas é uma visão perigosa, porque inelutavelmente se volta sobre si própria levando, para ser coerente, a considerar a Terra como o Éden primeiro e derradeiro de toda a inteligência; e isto, cientificamente, é absurdo. Mas tudo na América é um pouco absurdo. Pois não foram os democratas americanos que imolaram o ídolo americano por excelência, Superman – e, mais recentemente (2007) o Capitão América? E isto, na óptica americana, não é, cientificamente, etnicamente,  pedagogicamente, menos absurdo. Para mim, creio que para todos nós, a morte de Superman foi uma estranheza, algo que as melhores análises e argumentos não conseguiram pura e simplesmente justificar; e afinal, vejo-o agora, terá sido esse um dos sinais mais evidentes de que algo na apoptose americana descarrilara – de que a América começara a eliminar arquétipos que não poderia regenerar, ou, mais simplesmente, que o interface passara a fornecer-nos a imagem de uma América decadente e suicida. A América estava terrivelmente doente – e nós não nos apercebemos disso. Mas como nos poderíamos ter apercebido? Embrenhados na nossa própria Revolução socialista, empenhados numa semântica estrutural nova e internacionalista onde a nossa aprendizagem política buscava um discurso universal nivelado pela necessidade urgente de solvermos as nossas próprias carências, quantos de nós tinham uma preparação intelectual suficiente para olhar os “brinquedos” americanos como algo mais do que tralha nostálgica – para não dizer simplesmente lixo capitalista -  no sótão da nossa infância? Dessa infância, resistira a fantasia. E agora? Que resistia na América – na casa do papão capitalista?

O fantástico resistiu. A ciência onírica dos voos espaciais era, por si só, fantástica, e a explosão tecnológica da rede mediática mundial partiu à desfilada nos maravilhosos corcéis da informática. A criatividade libertou-se mais e mais das limitações e dos condicionamentos circunstanciais. O cogito ergo sum transformou-se em cogito ergo factum. O faber igualou o sapiens.

Por outro lado, o aparelho bélico dos USA parecia tudo menos caduco. Que limpeza, a Guerra do Golfo! Que susto, a retaliação na Jugoslávia! Que laboratório, a Guerra das Estrelas! E o dólar, igual a si próprio! A América, doente? Ninguém acreditaria. E, no entanto, era verdade. A América estava doente, de uma doença velha como o Homem e que se chama solidão. Perante a União Europeia, os Estados Unidos sentiram-se, pela primeira vez na sua História, sós. E o velho motor diluiu-se pelo mundo, agora unido num esforço de cooperação superior, sim, mas sem o fulgor e a pujança dos tempos míticos da Apolo 11. De repente, a coisa melhor do Novo Mundo – a juventude – foi atingida por outra doença endémica da civilização: amadureceu. Aquele coração vibrante e escalar ao cintilar das estrelas remeteu-se à serenidade do pior inimigo da invenção: a sensatez. E a águia republicana regressou às white mansions, outrora futuro, hoje passado, apenas porque o mundo democrático se tornou incapaz de gerir a diferença - por se ter recusado à depuração da sua ideologia. A democracia é a ágora, o confronto dinâmico e criativo da diferença; mas quando a democracia é incapaz de gerar estabilidade, o povo regressa à certeza estratificada da casa, à tradição, ao culto da ancestralidade e da família – e estiola. The House Wins – The House Must Rule. A América viveu uma década de euforia democrática – e foi para casa.

Fatalidade? Não creio. Esta América republicana ancorada aos seus liminares 51% eleitorais é muito diferente da velha América conservadora de que George Bush pai foi o último representante. Esta América que prefere voltar a casa não o faz já como outrora o filho pródigo, indigente e arrependido – fá-lo  porque conquistou na democracia um capital novo que essa democracia não conseguiu potenciar: a independência. E porque é que a democracia não conseguiu potenciar esse capital de independência cultural e económica? Muito simplesmente porque, nos USA, democracia e república não chegam de modo nenhum a ser a cara e a coroa do almighty dolar, mas é sim este que as rege a ambas. Na realidade, a ideologia americana mais consequente no quadro económico-político actual não é a democracia, mas a república. Sempre que os democratas americanos chegam ao poder, vêem-se confrontados com a insanável contradição de terem de gerir a “herança” do capitalismo - coisa que o sector yuppie faz, afinal, de bom grado, mas só enquanto o avolumar das contradições lhe permite alguma margem de manobra. Transformar o sistema? Como? A lógica económica dos USA é a lógica das multinacionais, e na verdade eu até nem gosto do termo imperialismo aplicado à estratégia económica americana porque, de facto, a sua mola real é o comércio e não o império. À América o império não lhe interessa de facto para nada – é até mesmo uma chatice tão incómoda em Washington como já antes o fora em Roma, que obriga a compromissos de administração e tutela que estão definitivamente  fora do seu catálogo dilecto. A América gosta em primeiro lugar de fazer, fazer qualquer coisa, possivelmente grande e preferivelmente vendável. Até aqui os americanos são mesmo louváveis, constroem, de facto; mas logo que vendem perdem-se completamente nos delírios do mercado de capitais, adoram aquilo, jogar na bolsa, rebentar grandes boléus com investimentos suicidas para depois captarem por uma tuta e meia tudo quanto foi na rede – e comprar mais umas casitas para por no tabuleiro do Monopólio mundial. As megalópolis americanas excitam naturalmente tudo quanto mexe em dinheiro em todo o mundo – e depois a bola de neve faz o resto. De repente, estão milionários – e tornam-se paternalistas. Quando chegam à meia-idade assentam arraiais paredes-meias com a saudosa West Point da juventude e acabam por se repartir pelos três grandes pilares em que assenta a estrutura senatorial: o capital, a investigação industrial e o sector militar. A cultura nos USA é de facto um apêndice da indústria. Os três sectores dividem em partes iguais os poderes legislativo, executivo e judicial – and the beat goes on. O verdadeiro reverso da medalha de tudo isto acaba por ser, estranhamente, a fantástica explosão criativa que ninguém afinal se esforça demasiado por provocar, porque ela é uma consequência natural que escorre também natural e continuamente das franjas de todo o processo. É aí que surgem feéricas New York, Chicago, San Francisco, Las Vegas! E é como corolário de tudo isto que a América surge culturalmente revolucionária para todo o mundo. O caldo onde fervem as imensas urbes cosmopolitas transborda naturalmente das novidades destiladas no choque das culturas de todo o planeta – e essas novidades são imediatamente trabalhadas e buriladas pelas tecnologias mais avançadas que diariamente evoluem em todo o globo e que o dólar se encarrega de canalizar, de acordo com as circunstâncias. Mas, é “assim”?

Bem, não é só assim. O submundo da América – o underground – é um dos maiores ghettos de miséria de todo o planeta e o maior serviço assistencial do mundo digladia-se quotidianamente com a maior taxa de criminalidade da Terra. A agricultura dos USA é um sector modelo completamente mecanizado que, com uma população mínima e abastada, se debate fundamentalmente com as crises de superprodução. A taxa de desemprego é uma das menores do mundo; mas o mais estranho é que desses milhões de desempregados a maioria é-o por opção, e não porque de facto não consiga encontrar trabalho. O underground é um mundo de drop-outers, de marginais “just because” e, sobretudo, de inadaptados - os misfits. Muitos marginalizam-se apenas porque não suportam o confronto da sua sobrevivência digna, mas medíocre, com o luxo insano, perdulário e humilhante dos mais favorecidos. Que custa embeber estes farrapos humanos de certezas agudas e irracionais que a si próprios os façam servir-se mortos? Muito pouco, com certeza. Quando o vil metal robotiza os corpos e as consciências, o campo emocional torna-se um empecilho ridículo e urgentemente descartável – e nesse mesmo instante, a morte inexorável enceta o seu tique-taque decrescente. Milhões de seres humanos do nosso planeta, de todos os estratos sociais, optaram pela amputação emocional como estratégia de sobrevivência – e, afinal, são semelhantes à galinha decapitada que continua a sua corrida espavorida: já estão mortos, mas ainda não o perceberam.

To Land in Manhattan

No contexto mundial actual, a vitória da linha da frente só pode ser uma vitória política que reflicta inequivocamente a razão superior dessa vanguarda. Este é um nível de superestrutura novo, sobretudo quanto às ferramentas que passaram a estar ao nosso alcance para a sua detecção, compreensão e replicação. As vanguardas revolucionárias do Internacionalismo I – de que Cuba, a ocidentalizada China e a Coreia do Norte constituem as derradeiras expressões – dispunham já do materialismo dialéctico como filosofia científica para a Revolução; mas não dispunham ainda – não podiam dispor – dos novos e maravilhosos instrumentos de análise frutos dessa mesma Revolução. A mediatização mundial tornou-nos hiperconscientes – e o reflexo superestrutural colheu—nos em cheio onde pensávamos só existir idealismo. Lenine referiu-se repetidas vezes à necessidade de constantemente reflectirmos a teoria sobre a prática. Nesse tempo – nesse campo – a revolução era uma urgência imediata que lidava com os mesmos problemas que Marina tenta hoje solver: a ideologia estava ao serviço da sobrevivência. E continuou a estar, como é evidente. Mas o Comunismo cravara suficientemente as suas garras na estrutura mundial, e quando o previsto colapso (Lenine) do aparelho de estado soviético se verificou, diluíra-se já por todo o mundo como o fermento para a nova etapa revolucionária. O Comunismo cumpriu-se na sua missão histórica; e o Internacionalismo venceu.

Eis a razão histórica pela qual a União Europeia foi possível onde, no mesmo contexto geográfico mas num tempo diferente, os Estados Unidos da Europa soçobraram. Os construtores da União Europeia  diferem dos antigos europeístas porque não têm uma visão meramente apriorística do seu intento; não os move um sonho de nação ou de império como então acontecia, mas sim o desejo de criar um instrumento eficaz para a gestão comunitária. Esta é uma visão científica, realmente superior (conquanto fundamentalmente pragmática e circunstancial), que só foi possível devido a essa radicalização do internacionalismo. Ao sermos europeus somos, antes de mais, cidadãos do mundo.

Ser um cidadão do mundo é um direito que se conquista através da evolução. Não é inato, porque exige a consciência esclarecida que deve informar a atitude coexistencial. Mas é um direito que se fixa estrutural e geneticamente na modulação decisiva do Mundo Novo. E é exactamente aqui que a diversidade circunstancial hiper-exponenciada nos colhe com a visão do mundo superestrutural. E é exactamente aqui que começa a nova ideologia que somos chamados a elaborar.

 

Quantum People

O mundo superestrutural é, em muitos aspectos, semelhante ao nível quântico. Podemos facilmente aceder a ele através da construção arquetípica circunstancializada no debate, que nos revela a discretização do campo existencial na derivada orbital onde se fixam os módulos gemulares do voo gnóstico. O primeiro corolário precioso que colhemos desta experiência é que essa discretização não resulta necessariamente, como o pulsar narcisista nos poderia fazer supor, de um antagonismo tese-antítese, resolúvel ou não, entre os intervenientes no debate; é uma consequência natural da diversidade dos campos que estruturam todo o edifício social – campos estes que, na sua evolução exponencial, constantemente reivindicam o reconhecimento. Daí a sua alteralidade, que nos permite identificá-los e visualizá-los mesmo como componentes potenciados em standby, prontos para a qualquer momento se articularem nas novas cadeias lógicas que o desenvolvimento teórico-prático constrói. Tudo se passa como se cada interveniente no debate fosse um nível orbital elementar cujos electrões (as gémulas gnósticas) cintilam na sua nuvem de indeterminação. Quando uma dessas gémulas entra em sintonia com uma gémula de outro nível, as duas gémulas auto-replicam-se e os dois (ou mais) níveis envolvidos no processo trocam as cópias entre si – e o processo continua até que cada nível conclua uma nova síntese. Até aqui, o átomo que no nosso exemplo ilustra o campo de debate cintila em equilíbrio – dizemos que o processo flui numa ilha de estabilidade. Mas nem sempre as teses gemulares encontram campo de sintonia propício no envolvimento dialéctico. Quando tal acontece, a gémula ímpar entra, como dissemos, em standby, e a tensão do seu nível orbital decai até que uma nova gémula, desse ou de outro nível, reate a sintonia replicante. Vemos deste modo que o nosso átomo pode viajar estados quânticos variáveis cuja estabilidade é uma função estatística escalar à cadência processual. Qualquer átomo (radioactivo ou não) é uma estrutura que se mantém estável porque os seus componentes se encontram em equilíbrio harmónico; e essa harmonia resulta também do modo como as diversas frequências de onda flutuam na nuvem electrónica.

As ondas atómicas são ondas quânticas. Isto significa que só podem existir como múltiplos de uma harmónica fundamental discreta que constitui a frequência atómica de cada elemento considerado (algo que poderíamos traduzir matematicamente com uma expressão do tipo F (x) = (d/2)n, em que d/2 é a constante de Planck). Ou seja, existe um ritmo, uma cadência subjacente à pulsação do átomo e dos seus componentes que é sempre inelutavelmente respeitada; e sempre que uma vibração surge desfasada (sempre que surge uma onda prima, expressão derivada por analogia com os números primos) é imediatamente congelada como uma gémula em standby, provocando uma mudança de estado por decaimento orbital.

As gémulas latentes são sempre altamente instáveis. Numa primeira fase, provocam um estado de excitação do átomo (do debate) devido à inércia de formação que transportam; mas o seu spin inverte-se imediatamente devido à queda energética da sua orbital, queda energética essa que coloca a gémula em modulação de frequência (libertando uma partícula alfa, que detectamos) até à recuperação da sintonia (alpha decay) ou, se o seu momento escalar tange a constante de expansão (limiar de desestruturação), distendendo o seu campo gluónico numa perda de fluxo que precipita a redução quárquica – queda electrónica para o átomo (beta decay), gémula nula para a orbital dialéctica considerada.

Espaços Criativos

O problema de as gémulas serem ou não goradas é afinal um problema de espaço criativo. Atingimos por vezes limites onde sentimos que o escalar universal é potenciado, e naturalmente embriagamo-nos no seu desenvolvimento. Mas imediatamente somos colhidos por um reflexo que nos exige um nível superior de consciência - de autoconsciência; e nesse instante temos de decidir se nos interessa ou não potenciar o espaço criativo que apercebemos. Porque é que deste modo uma coisa desejável se torna problemática? Porque a estrutura autónoma que é o nosso corpo exige um cuidado material (matéria circunstancial), uma transferência do nível metafísico para o da realidade concreta. O equilíbrio do fluxo pulsional é constante - e radical. Sempre que incorremos num risco de desestruturação, o nosso sistema de alarme dispara rumo à constante de expansão e extrapolamos imediatamente a melhor derivada circunstancial para o quotidiano. Trata-se, ainda e sempre, de um equilíbrio económico. A nossa troca estrutural está sempre em sintonia com a daqueles com quem convivemos: é por isso que a investigação científica se constitui como um escalar de condensação - histórica. Orbitamos, afinal, o nosso Tao.

                                                            ***

Amor é ter uma sequência inutilizável, como todos sabemos. É preciso compreender profundamente o que é o “Wall of Stars” – o Passeio das Estrelas, com as impressões palmares das estrelas de Hollywood impressas no chão de cimento e por elas assinadas (e uma pequena estrela de metal ao lado, com o rosto do homenageado imerso numa lente transparente) - para termos uma pequena noção do que é o espírito americano que criou a XXth Century Fox e avançou com a Touchstone Pictures pelo século XXI. A proliferação do cinema americano no final do século XX  - que se mantém, um pouco mais madura, mas igualmente imparável, neste século XXI – proporcionou vias de escape privilegiadas para os sonhos de criatividade feérica da evolução. Escape não como fuga ao esforço construtivo, mas como possibilidade de desenvolver projectos ousados – e torná-los rentáveis economicamente. Onde antes prevalecera o sexo alienado e a violência gratuita, passaram a delinear-se, cada vez com mais vigor, semânticas analíticas portadoras de uma linguagem completamente nova, deslocando decisivamente o foco do filme de tese europeu dos anos 60 e 70 para a América do novo cult movie, onde a tecnologia e os efeitos especiais são de facto ferramentas ao serviço do cinema científico. Ou seja, o Sonho Americano continuou a marcar pontos na realidade. Somos frequentemente testemunhas de críticas acerbas tecidas por um sector de opinião que se pretende purista contra a explosão dos efeitos especiais, que o tremendo avanço da informática veio potenciar a um grau de perfeição que só tem limites no seu próprio imaginário. É este, afinal, um problema de fundo que a guerra em directo da televisão veio colocar, ao transformar a guerra num produto mediático de consumo gerido pelo broadcasting de grandes cadeias de difusão como a CNN e a MSNBC, saturando o mundo com o novelo sem fim do Médio Oriente, os túneis de babel do Afeganistão ou os raids elegantes sobre a Jugoslávia – até que o Rambo salta para o Telejornal e o cidadão comum, que deita uma olhadela ao televisor do supermercado, começa subitamente a computar o crédito disponível para a aceitação mediática.

As grandes superproduções cinematográficas envolvem actualmente orçamentos superiores aos de pequenos estados. Qual é o espectáculo mais fácil de produzir? O dito quotidiano que vai até à guerrilha entre estados arruinados (que de bom grado desempenham as ribaltas de Marte na arena internacional a troco das infalíveis benesses imperiais) e ao colapso das torres do World Trade Center – ou a encenação assumida pelas superproduções e superséries de TV? Quando o desenvolvimento da 3D permite a criação de uma realidade virtual indistrinçável da realidade concreta, onde é que, de facto, se centra o cenário crível? O World Trade Center é uma superprodução vendável? Quem são as máscaras de lust, greed and glory responsáveis por essa produção? Que grande rasoira é essa que pretende clivar o mundo entre os espertos, que dirigem, e os papalvos, que não fazem a mínima ideia do que é um blue-screen? O cidadão comum dificilmente poderá pagar uma viagem aérea a New York para se certificar in loco da realidade; e, mesmo que o fizesse, nada lhe garantiria que o cenário de destruição que, na pior das hipóteses, encontrasse, não fosse uma mera componente de uma planificação de um nível estrutural mais dissimulado. O mundo tornou-se kafkiano. Quando Spielberg afirma numa entrevista "Estou demasiado ligado a extraterrestres. São o supra-sumo da inteligência artificial, o ponto de perfeição máxima dos robôs. Criaram-se a si próprios e continuarão a reproduzir-se porque a humanidade desapareceu da face da terra" está apenas, afinal, a lançar um apelo desesperado a este mundo onde a desconfiança impera, o quotidiano avança para uma contabilização a 100% e o desencontro é a água amarga da sobrevivência. Superestrutura, Fronteira Estrutural, Inteligência Artificial, A. I.

                                                             ***

Afinal, começamos a detectar que a América não é bem assim – que corresponde ao nosso muito melhor. Mas é um muito melhor que sabe que necessita do know-how de Land in Manhattan (que necessita de constantemente replicar a sua própria evolução) para se identificar. Lá em baixo, Spielberg colige as derradeiras anuências da equipa de filmagem e há um imenso cenário branco onde cintilam presenças estelares enlaçadas nos seus duetos acréticos vogando nos anos-luz; e compreendemos o quanto o passado é escasso e efémero na plenitude do nosso reflexo existencial. Mas a nossa distalidade tem de ser radical.

A.I. é muito mais do que um filme – é uma janela entre o nosso banal quotidiano e o mundo fantástico onde flui a nossa criatividade. No fundo, trata-se de uma matriz programada para uma focal hipertensa – de uma visão superior. Que é sempre uma redescoberta de um nível muito mais tangencial ao voo escalar – e a matriz flui como uma orbital do manto existencial, fotogrâmica e multidimensional. É, portanto, uma experiência muito intensa.

É esta capacidade que o novo cult movie americano tem de gerar dinâmicas-limite que o transforma numa metrópole do futuro – onde o grau de certeza científica subjacente aos campos de desenvolvimento possui pelo menos 51% de exequibilidade. O velho mundo vai-se esvaindo de nós naturalmente, à medida que progredimos na nossa jornada através do espaço-tempo e a nossa construção evolui. Eis uma exequibilidade que é um espelho do significado liminar e decisivo desse símbolo, 51%. Na América, nos USA do fim de Setembro de 2001, a Area 51 está no Poder. Isto é fundamental para os sérios cultores da inortodoxia científica, para os caçadores de singularidades que escapam à lógica do nosso quotidiano, inclusive a níveis decisivos onde o reino do consenso é soberano – os níveis do reflexo estrutural. O trabalho desenvolvido no evento Area 51 desde a sua criação conquistou uma importância e uma autonomia suficientes para que a veracidade do incidente de Roswel seja uma mitologia paralela e secundária. Hoje, é banal um quadrado brilhante de polyester que amarrotamos sem vincar; mas o incidente de Roswel remonta a um tempo onde tal artefacto não existia sequer como teoria científica. Então, como é que ele aparece nos vídeos coevos ao acontecimento? É este anacronismo circunstancial que, mais que a novela do romântico alien interface, nos capta a atenção. Um gene alienígena para a evolução? Uma experiência de tempo local? O tema do objecto que é transferido do futuro para as mãos da heroína gentil como reflexo revolucionário é comum a toda a tradição onírica infantil; mas até então nenhum dos imensos depoimentos de hipotéticas testemunhas desse facto colhera um impacto mediático tão forte. A Area 51 começou por especializar-se na detecção e registo de acontecimentos deste género e evoluiu no estudo das suas implicações estruturais, bem como na pesquisa e desenvolvimento de meios eficazes de controle.

 

2001 Qubits

A hiperconsciência gerada pela diáspora informática colocou-a às portas do mundo quântico – um mundo onde a dualidade se traduz em qubits, pacotes de informação estrutural articulada de um modo quárquico. Podemos considerar um qubit como um tetraedro informático. Este tetraedro pulsa entre a sua solução tensorial – a cruz axial – e o modo nebular. Dizemos que o  primeiro estado é um estado aberto e designamos o segundo estado como fechado. No estado aberto, o qubit é, portanto, uma matriz definida pelo cruzamento normal de três tensores infinitos – uma intersecção de energia zero. Ou seja, é uma função aberta com três raízes de campo infinito. Mas a primeira definição espacial (volumétrica) de três tensores infinitos (definição espaço-temporal) é o tetraedro, equilátero para a matemática geométrica, geodésico para o mundo quântico da nucleossíntese particular. Isto significa que num tetraedro quântico existem três tensores estruturais, cada um dos quais constitui uma unidade de informação discreta (qubit fechado hexadecimal). O tetraedro geométrico é, evidentemente, equilátero e equiaxial; mas esta abstracção não se verifica na realidade física do nosso universo. O muro de Planck impede a nucleossíntese abaixo de um nível energético definido (o tetraedro geométrico constitui um nível de energia zero) e o princípio de incerteza, aliado ao princípio de localidade, implica que as três raízes da função estrutural básica são necessariamente sempre diferentes. Temos assim que um qubit constitui um pacote de informação que transporta não apenas uma informação (0 ou 1, + ou -, ligado ou desligado) mas a informação de cada tensor axial, que podemos ampliar ainda para soluções de grau 2 (emparelhamento tensorial), de grau 3 (emparelhamento à tensão superficial), etc. Se injectarmos num cristal de grafite (ou diamante) três sinais axialmente azimutados ao octeto (qubit) fundamental (três fluxos normais), todos os átomos do cristal conservarão a informação recebida como um tetraedro quântico – na realidade, todo o campo quântico do cristal fica azimutado; e essa informação pode ser lida enquanto esse campo não for modificado.

Consideremos um fluxo de electrões que passam, um a um, através de um campo magnético tridimensional variável segundo três cordas fundamentais (que constituem a informação básica que pretendemos arquivar). As três funções são replicadas ao longo do fluxo electrónico que, deste modo, se transforma num fluxo modulado de informação. Mas enquanto antes cada quanta (bit) apenas informava sim ou não, agora informa a, b e g, bem como as relações ab-c, bc-a e ac-b. Transformámos um electrão num byte quântico – um qubit. Multiplicámos o fluxo de informação por unidade de tempo.

Este acréscimo de rapidez é precioso para a evolução dos nossos processadores. As novas fine arts exigem processadores capazes de tratar grandes caudais de informação em tempo útil – e a paleta de uma régie tem mesmo de funcionar em tempo real. Aperfeiçoamos filtros cada vez mais sofisticados que modulam a informação das nossas transmissões, proporcionando um tratamento de imagem e som completos – a pesquisa sectorial da realidade – e isto implica a necessidade imperiosa de ludibriar a fatídica velocidade da luz para que o sincronismo final se mantenha. Os qubits proporcionam-nos esse artifício, como vimos, porque, no mínimo, “triplicamos” a velocidade da luz.

Realidade

A realidade mediática tornou-se manipulável a um nível que permite happenings sublimes, mas que transforma o quotidiano num terminal igual a milhões de outros – até o próprio conceito de quotidiano entrar em deriva e a drive passar a ser uma componente fundamental das nossas vidas: o nosso modulador de interface, a nossa riqueza escalar. O Homem do século XXI foi forçado pelos condicionalismos evolutivos a transformar-se num vagabundo da sua própria criatividade. O desenvolvimento tecnológico colocou à sua disposição ferramentas de elaboração virtual cada vez mais aperfeiçoadas que lhe permitem reproduzir o seu universo onírico até o converter numa para-realidade documental que não cessa de transbordar para o quotidiano. Os sonhos e gatafunhos outrora afogados pela sobrevivência são hoje propostas dia a dia mais convincentes servidas pelo hiper-realismo cibernético. O pensamento mítico que gerou as gravuras de Foz Côa ou as pinturas de Antelas e Altamira transformou-se no pensamento político subjacente à arte interventiva actual. E o mais estranho é que começamos a interrogar-nos acerca de qual das duas atitudes é cientificamente mais coerente: a dita primitiva, que procurava conjurar divindades ocultas capazes de modificar a realidade, ou a dita moderna, que visa exactamente os mesmos objectivos com meios basicamente semelhantes, se bem que circunscrevendo-se ao pragmatismo científico. No dia em que o cansaço da contagem obrigou o homem a elaborar o conceito matemático de infinito, Deus tornou-se cientista; a teoria do big-bang pôs o homem às portas da Criação, no Primeiro Dia; a constante de expansão universal tornou-se uma citação quase banal para a expressão da física elementar e o moderno conceito de escalar, depurado na teoria auto-similar e clarificado pela Física Dimensional, tange a Ubiquidade. Neste mundo onde as experiências imaginárias que eclipsaram o gato de Schrödinger cederam o lugar à experimentação e manipulação concreta da matéria e energia quânticas, a Realidade tornou-se mutante; o dia das surpresas - “the end of the world as we know it” – alvoreceu em Alamo Gordo, com a explosão da primeira bomba de fissão. A partir daí, a linha histórica mundial não é mais do que a derivada de probabilidade do princípio de incerteza; e, se é um facto que evoluímos, não é menos verdade que o imenso mar da ignorância igualmente se nos revelou, cada vez mais atro e obscuro, na vastidão tentacular do universo onde teimamos em prosseguir. É verdade que o gigante Adamastor está morto; mas o preço dessa morte é, mais do que a nostalgia de Vénus, o termos de assumir a gestão do nosso olimpo quotidiano. A Nova Física exige-nos um renascimento, uma suprema consciência perante o Universo e as suas leis que implica uma Ética absoluta, sob pena de perecermos afogados e despedaçados na voragem da matéria.  Somos nós próprios que evoluímos no entanglement quântico e biónico, de tal modo que, se não nos domesticamos estruturalmente, veremos os nossos computadores transformarem-se em alien machines bizarras, imprevisíveis, incontroláveis, caóticas – inúteis.

Tornámo-nos singulares – e essa singularidade adensa-se, mediaticamente controversa, à medida que a diversidade se dilui na massificação e as áreas geoestratégicas se reduzem gradualmente com a criação de blocos cada vez mais abrangentes. O Homem Novo é, cada vez mais, o Homem Global. A nossa realidade transcendeu o novelo de Ariadne onde fomos inscrevendo o nosso percurso histórico – e, desse novelo, só poderemos extrair um referencial de coerência se soubermos optar, na leitura dos silogismos concretos do quotidiano, como outrora optámos na depuração filosófica de que o mundo hiper-real é a exegese.

É esta nova atitude perante o universo que irá pontuar a evolução humana nesta nova etapa. O carácter exponencialmente hiperbólico do nosso discurso não é mais do que um reflexo do estado de maturidade a que chegámos: a espécie humana está pronta para a diáspora estelar e o mundo já não é, de facto, suficiente.

“Não é nada assim de tão novo”, dirão os mais cépticos, afivelando a máscara de bonomia com que gostam de saudar a paisagem matriarcal sofista de eternidade. “Sempre existiram homens que olharam para as estrelas e para quem o mundo se tornou uma prisão insuportável; muito antes de Cyrano de Bergerac e Jules Verne descreverem as suas viagens fantásticas já os registos das religiões primitivas falavam de carros de fogo riscando os céus; sempre existiram alucinados – são as vítimas do desvario de Ícaro.” Mas, de facto, estão errados. É certo que uma mera análise das variações implícitas no imprevisto genético nos devolve como natural uma espécie onde o cinismo é a marca e a defesa da mediania; mas seria absurdo não considerarmos plausível a existência de seres humanos mais aptos – no mínimo, mais esclarecidos – para quem a gestão dos destinos dos povos, das nações e das culturas é um objectivo superior. Ou seja, que não são suicidas – e que recusam o suicídio. Todos os grandes vultos da História têm essa característica em comum, esse espírito indómito, mas positivo, que os impede de abdicar (é neste sentido que os desvios comportamentais atípicos são suicidas, porque implicam uma abdicação do émulo, da diferença congénere que legitima a eternidade).

Já a insinuação de alucinação é mais subtil, mais tangente ao desespero dessa mediania que a produz. Os medíocres temem a evolução, a inovação, a diferença – e esse temor transforma-se em ódio, um ódio cego e irracional a tudo o que é novo, a tudo o que implica mudança e, consequentemente, a tudo o que significa vanguarda. O céu do medíocre é uma constituição à prova de revisão, imutável, sanção e garante da estagnação circular personificada nas matronas a quem lambuzam os dedos gorduchos ou cujos perfis ascéticos veneram; é essa a única simbiose que o seus cérebros de parasitas conseguem conceber – os outros fazem, não por mérito próprio, mas apenas porque são as bestas a quem essas incómodas tarefas foram adjudicadas. E o seu estatuto de maioria nivela o resto. No rosto da sua moeda está Ícaro; no reverso, Prometeus. São perigosos, evidentemente; mas constituem o caldo de cultura que gera as excepções – as boas e as más. É claro que essas excepções são igualmente ostracizadas como desvios incómodos; se o crime e a loucura são naturalmente recusáveis, porque não rotular de loucura eventualmente criminosa a atitude dos que ousam a excelência? E é o que fazem, em parte culpados pela contradição que a igualdade que apregoam induz no seu circuito de compaixão, em parte inocentes – pois se eles de facto nem entendem o que os realmente superiores dizem e fazem, e muito menos o que são!... A alucinação colmata todo o peculiar, toda a estranheza – e o carimbo da alienação é a eficaz solução final, se...

Quando é que os alucinogénios foram incorporados na dieta humana? Desde a pré-história, como o demonstram os resíduos arqueológicos recolhidos. O culto dos psicotropos remonta às primeiras experiências da humanidade, como é óbvio – não é sequer um exclusivo dos humanos, já que os próprios animais selvagens recorrem à farmacopeia natural, tanto como lenitivo como iguaria. A descoberta teve naturalmente o preço de inúmeros desastres; o homem primitivo que sobrevivia adquiria o conhecimento dos efeitos dos psicotropos naturais e tornava-se um elo de ligação com o sobrenatural. Importante. Mas esse culto ingénuo da natureza acabaria também por ser absorvido na voragem da mediocridade decadente. A mimese circunstancial do alucinado com o louco levou inevitavelmente à utilização do segundo como sanção para a perseguição ao primeiro; e não apenas por temor, mas também como arma para a eliminação do poder concorrencial indesejável de bruxos e feiticeiros, de bruxas e feiticeiras; e, sobretudo, para a anulação dos iluminados. Os psicotropos, bem administrados,  produzem génios, evidentemente; mas são perigosos: o confronto com uma perspectiva radicalmente diferente do absoluto pode matar facilmente os que pensam poder profanar impunemente as fronteiras da realidade – e os medíocres não gostam de correr riscos.

Eis o cenário, fértil em contradições, onde Galeno ensaiou o seu contributo para o dealbar da farmacologia científica moderna. Contributo que viria a ser desenvolvido por inúmeros seguidores, até que o advento da civilização industrial e das novas tecnologias propiciou a revolução da moderna química orgânica e dos seus inúmeros derivados. Os medíocres de todos os orçamentos rejubilaram! Agora, era finalmente possível ter acesso aos reinos proibidos de uma forma segura, sintética, moderna, através de comprimidos, pomadas, xaropes, supositórios e injecções nas veias, nas teias e nas areias! A burguesia do século XIX afogou-se em láudanos de todas as cores e desceu extasiada a espiral alucinada dos alcalóides, justificando-se perante gerações sucessivas com o infindável martirológio que viria a constituir a patologia demencial e virulenta dos tempos modernos. Algumas mentiras têm o condão de, bem cultivadas, se transformarem em realidade  - e que melhor adubo para este caldo de cultura do que os enredos de ocultação e disfarce onde os jovens infantes colhiam os códigos de honra e coragem para os campos de batalha? Da Guerra do Ópio só espanta que apenas tenha sido uma. Da medíocre burguesia ocidental só espanta que tenha sobrevivido – se é que podemos chamar sobrevivência à existência estéril e entediada dos burgueses de novela dos tempos modernos...

Com que então, alucinações! Desaparecidos, lares desfeitos, vidas arruinadas, visões de pesadelo – tudo estava à vista de todos, a mutação inexorável dos interfaces à medida que as psiques alteradas desbravavam novos níveis de realidade, a recorrência cíclica da estratificação circular. Mas que estávamos a mexer na estrutura – ninguém o ousaria afirmar e muito menos defender. O problema da droga tornou-se o mais refinadamente hipócrita da civilização contemporânea, com os verdadeiros drogados transformados em carrascos dos jovens investigadores assumidos e com a verdadeira droga – a estereoquímica dos agonismos subtis programados para a dependência social crónica – a florescer impune e exuberante no mercado das multinacionais e trusts farmacêuticos.

Em Portugal, desde muito cedo que a revolução socialista, ela própria enredada nas contradições contra que teve de esgrimir, se apercebeu da enorme irrealidade e, sobretudo, da estranheza comportamental que envolvia o problema. O trabalho de análise foi longo e cauteloso, mas imparável; e a implementação de estratégias para debelar a teia que neste oceano de contradições agrilhoara tantos e tantas jovens, marginalizados e afogados numa incompreensão total do que de facto se estava a passar, iniciou-se e prossegue em todas as frentes. E aconteceu o inevitável: o espírito, liberto, recomeçou a pensar, tímido e um pouco disléxico a princípio, mas gradualmente mais lúcido, transparente – e consequente. O nosso computador quântico encetou um varrimento cruzado a todos os níveis; fomos recolhendo todas as discrepâncias, por excesso e por defeito, oriundas dessa análise estrutural. E despertámos vivos para a manhã do fatídico dia 11 de Setembro, a tempo de vermos as garras dos aviões suicidas que, como uma hérnia de singularidade, se curvavam sobre as torres do World Trade Center e sobre o Pentágono – sobre essa América que finalmente aprendêramos a compreender historicamente – e a amar. Quem nos pode negar o direito de agora sermos nós a dizer: “Fake! Alucinação!”

Hello, America! What’s wrong?

 

Make a free website with Yola